Anti-intelectualismo e Booktok: Pessoas razas, mentes vazias

Nos últimos anos, as redes sociais transformaram radicalmente a forma como consumimos cultura, arte e conhecimento. Entre essas plataformas, o TikTok — com seu formato ágil, visual e viral — conquistou protagonismo, alterando profundamente a dinâmica da leitura, da filosofia e até do pensamento crítico. Um dos fenômenos mais preocupantes desse cenário é o crescimento do que podemos chamar de anti-intelectualismo viralizado, especialmente dentro do chamado BookTok, o espaço dedicado à literatura na plataforma.


O que é o anti-intelectualismo no TikTok?


O termo anti-intelectualismo descreve a rejeição ou desvalorização do conhecimento especializado, do pensamento crítico e da reflexão profunda. No TikTok, isso se manifesta de diversas formas, como:

  • Filosofia reduzida a frases feitas: citações descontextualizadas viram memes e conteúdos estéticos que geram engajamento imediato, mas pouco aprofundamento. Essa pseudo-filosofia alimenta uma falsa sensação de erudição, sem compromisso real com o pensamento crítico.

  • Disseminação de pseudociência e teorias conspiratórias: vídeos curtos e impactantes, muitas vezes sem base científica ou formação adequada, ganham enorme alcance, colaborando para a propagação da desinformação.

  • Rejeição da complexidade intelectual: conteúdos densos e desafiadores perdem espaço para ideias simplistas e narrativas que priorizam o emocional em detrimento do racional.

O algoritmo do TikTok privilegia conteúdos que provocam respostas emocionais rápidas e intensas, em vez de conteúdos embasados e reflexivos. Isso cria um ambiente fértil para a viralização do anti-intelectualismo.


BookTok: paraíso da leitura rápida ou da superficialidade?


O BookTok é um segmento do TikTok focado em livros e leitura, e seu papel é, ao mesmo tempo, promissor e problemático.

Por um lado, ele atrai novos leitores, sobretudo jovens, e impulsiona as vendas de obras clássicas e contemporâneas. Autores como Jane Austen, Dostoiévski e Clarice Lispector têm ganhado renovada popularidade — um aspecto claramente positivo e democratizador.

Por outro lado, o formato curto e altamente visual da plataforma incentiva leituras rápidas, superficiais e emocionais, e promove a estetização da leitura — quando o livro deixa de ser um objeto de reflexão para virar mero cenário de vídeos de “unboxing” ou um acessório para ostentar cultura.

Muitos influenciadores compram caixas de livros sem sequer abri-los, apenas para gerar conteúdo viral. Os livros são escolhidos pela capa, pela cor da lombada ou pelo número de curtidas do vídeo — e não pela qualidade literária ou relevância do conteúdo.

Essa estetização da leitura contribui para desvalorizar o livro enquanto espaço de reflexão e transformação pessoal.


Como o anti-intelectualismo afeta a literatura?


1. Redução da complexidade e da densidade literária

Autores e editoras sentem a pressão de produzir livros mais curtos, com linguagem simplificada, finais previsíveis e temas que “funcionem” no algoritmo das redes sociais. Isso gera uma homogeneização da literatura disponível, reduzindo a diversidade estética e temática.

Livros densos, filosóficos e multifacetados perdem espaço para narrativas que provocam reações rápidas — seja chorar, rir ou se apaixonar.

2. Culto à validação imediata

A leitura passa a ser menos uma experiência transformadora e mais uma performance social: mostrar que se lê, conquistar likes e se engajar na moda do momento.

Essa pressão por validação rápida empobrece o papel do escritor, que pode ser visto como mero “produtor de entretenimento”, e não como pensador ou agente crítico.

3. Desvalorização do autor e da obra como agentes de debate

A literatura sempre foi um espaço de questionamento social, filosófico e psicológico. Quando ela se torna mera mercadoria para consumo rápido, perde seu poder de provocar mudanças profundas no leitor e na sociedade.


Cancelar os clássicos: por que isso é um problema?


Outro fenômeno relacionado é o chamado “cancelamento” de autores clássicos como Dostoiévski, Kafka, Tolstói, Machado de Assis, entre tantos outros. Críticas baseadas em leituras superficiais ou em valores contemporâneos, desconsiderando o contexto histórico e literário, reduzem essas obras a estereótipos ou caricaturas.

Dostoiévski, por exemplo, é frequentemente rotulado de machista ou depressivo, sem que se leve em conta a profundidade da sua análise sobre a alma humana, o bem e o mal, a fé e o niilismo.

Diminuir essas obras a memes ou vídeos de 15 segundos é um desserviço intelectual que empobrece nossa cultura e o debate literário.


Não é só “burrice”: entendendo as causas do fenômeno


Rotular esse movimento como uma “onda de gente burra” é simplista.

O algoritmo premia conteúdos que provocam reações rápidas, não necessariamente os mais inteligentes ou profundos. Muitos jovens têm no TikTok seu primeiro contato com filosofia, literatura ou ciência — e, naturalmente, começam por um nível mais emocional do que racional, como quase todo mundo em algum momento.

O maior risco está em quando o discurso anti-intelectual se torna norma cultural, zombando da complexidade e exaltando o superficial. Muitos influencers sequer leram os livros, antes utilizam resumos feitos por IA. 


O que podemos fazer como leitores e escritores?


1. Defender a leitura crítica e profunda

Criticar autores e obras é legítimo e necessário — desde que com base em estudo, leitura cuidadosa e reflexão, não em opiniões rasas.

2. Criar pontes entre o antigo e o novo

É possível e urgente traduzir a profundidade dos clássicos para linguagens e formatos atuais, sem perder a riqueza dos textos originais.

3. Valorizar a literatura como espaço de fricção e desconforto

A boa literatura não serve para confortar sempre, mas para provocar, questionar e tirar o leitor da zona de conforto.

4. Produzir e compartilhar conteúdo que inspire reflexão


Ao invés de reproduzir a superficialidade, devemos ser agentes que incentivam o pensamento crítico e valorizam o livro como obra complexa e rica.


Ler com profundidade é um ato de resistência


Vivemos numa era dominada pelo imediatismo, pela dopamina instantânea e pela superficialidade — onde importa mais parecer saber do que saber de fato.

Nesse contexto, ler um livro complexo, refletir sobre ele, questionar e se deixar transformar pela leitura é um gesto revolucionário.

E escrever um livro que convide a essa reflexão é um ato ainda mais corajoso.


A literatura verdadeira sempre encontra seus leitores — mesmo que fora do hype. Então, se você é do time que ainda valoriza os clássicos, acredito que irá amar este box de quatro livros contendo Drácula, Frankstein, O Fantasma da Ópera e O Retrato de Dorian Gray, em promoção na Amazon: https://amzn.to/44Yi1GR 



 

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